segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Uma experiência para a vida…

E de repente, vi-me numa maca, a ser levada pelas auxiliares, por corredores e elevadores, até ao bloco operatório.
Ali me deixaram num corredor longo e imenso, com muitas portas e sempre muita gente a passar. “Agora fica aqui um bocadinho, que já vêm ter consigo”- disse-me uma das auxiliares.
E eu esperei. Ora deitada, ora levantando a cabeça para tudo mirar. Esperei pouco tempo. Mas esse pouco tempo, pareceu-me uma eternidade, porque os nervos iam aumentando. Ainda estava a tempo de desistir, pensei. Mas já tinha chegado até aqui, e passar o resto da vida a sofrer… Não, era melhor sofrer agora, e passar o resto da vida livre deste mal…
É incrível o cérebro humano: numa questão de poucos minutos, passam-nos milhões de coisas pela cabeça. O pior é que nem todas boas. Era o pessimismo e os nervos a aumentarem. Neste momento, o meu maior medo nem era o pós-operatório, mas sim este preciso momento, pois imaginava-me a ser alvo de uma troca de identidades, e a ser levada para uma sala onde me operariam a outra coisa qualquer… Não seria a primeira vez, lol… Hoje já brinco com a situação, mas naquela altura não.
“Olá boneca!” – oiço uma voz vinda por detrás da maca.
Não sei porquê, lembrei-me de meu avô, que estava sempre a chamar isso àquela que fazia parte de sua vida, e que ele cuidava como se fosse uma pessoa: a sua burrita, que tanta vez lhe foi buscar água à fonte. Foram grandes companheiros. E como a “boneca” lhe obedecia; acho até, que ela já sabia o caminho de cor para a fonte. Diz-se que os burros, apesar do nome, são animais muito inteligentes. E eu acredito que sim, pois contam-se imensas histórias de aventuras com seus donos. Meu pai costumava contar que certo senhor lá na vila, o “Ti… qualquer coisa”, que agora não me lembro o nome, geralmente andava sempre “borracho”, e quando ia buscar água, montado na burra, perdia a consciência, com certeza, e a burrinha levava-o sempre de volta a casa…
Hoje os burros são animais em extinção. Quem sabe se por já não precisarem dos seus serviços…
Mas aqui estava eu, prestes a ser operada, e a pensar em coisas incríveis…
“Está tudo bem?” – perguntou então a voz que me tinha chamado “boneca”…
Respondi que sim, mas pensei: “estava tudo bem até você chegar e começar a espetar-me uma agulha na mão para pôr o soro…”
“É doente do Dr Leitão, não é?” – perguntou ela.
Vá lá! Iriam levar-me ao Dr certo, lol.
Entretanto chegou o anestesista. Um senhor já de idade, que o médico me havia dito que fazia por dia uma média de 16 epidurais.
Fiquei mais descansada, pois devia saber o que faz. Quando me espeta então a agulha nas costas, mesmo na coluna vertebral, e começo a sentir um líquido a entrar. “Ui, isto dói imensooooooo”, e aumenta o meu sofrimento.
Esperámos um bocadinho que fizesse efeito, e lá vou eu para o bloco operatório. Já não sentia nada do peito para baixo. Meu Deus, que estranha sensação…
Confesso que imaginava uma sala de operações cheia de aparelhos por todo o lado, e tudo muito atafulhado de coisas. Pensamentos de quem nunca se viu nesta situação. Ao invés, encontrei uma sala gelada, com paredes de pedra mármore, umas luzes redondas enormes no tecto e uma bancada com instrumentos. Mais tarde uma enfermeira explicou-me que o frio evita a propagação de micróbios ou bactérias prejudiciais, e quanto menos houver numa sala, melhor, pois no fim de cada operação tudo é esterilizado. Só têm mesmo o necessário…
E ali estava eu… O médico sempre brincalhão, tentava animar-me. Ao todo, eram seis pessoas na sala. Eu ia ouvindo as suas conversas, enquanto o médico ia explicando aos outros, o que estava a fazer e como deviam fazer, etc…
Termos técnicos médicos, dos quais eu nada percebia. Assim, decidi rezar umas quantas Avé-Marias, e colocar-me totalmente sobre a protecção divina…
Na minha cabeça iam passando cenas da minha vida, e pensava: se sobrevivesse a isto, iria deixar-me de ocupar o tempo com coisas fúteis, pois tenho tanto ainda que fazer, e não sei o tempo que me resta. Projectos começados e inacabados, que eu ia pensando, em qual pegaria primeiro quando estivesse restabelecida.
Estava eu com meus pensamentos, quando fui como que acordada pelo médico, que veio à cabeceira, acenar-me com um bocado de pele roxa, que segurava com uma pinça. “Está a ver? Esta malvada não vai mais incomodá-la…” Lembro-me que fiz uma cara de repulsa, mas ainda pensei: como é que os médicos aguentam, sem vomitar, abrir-nos, ver e mexer nestas coisas?…
A operação durou apenas meia-hora. Pensar que em meia-hora, me livrou de 11 anos em sofrimento…
Médicos são anjos, com mãos divinas, aos quais só temos de agradecer quando no
s livram de algum mal.
Saí da sala gelada; passado um bocado toda eu tremia.
Levaram-me de volta para o quarto.
Tudo parecia bem e eu sem dores. Pudera, ainda estava sob o efeito da anestesia. Apalpava as pernas e a barriga e nada sentia. Demorou imensas horas a passar o efeito. Nesse espaço de tempo, pensei muitas vezes nos paralíticos. Agora sabia o que sentiam… Só que a diferença era que a mim me passaria, e a eles não. Senti-me uma sortuda, pois há pessoas com problemas bem maiores que o meu. Conseguir andar, é um acto que fazemos com tanta naturalidade, que nem damos valor…
Tive um pós-operatório muito doloroso. E só pensava como é triste estar doente. Como é triste nem conseguirmos levantar-nos, nem fazer a nossa higiene diária…
Estar dependente dos outros, é muito triste. E o período que passei em recuperação, em que não conseguia fazer nada, serviu para começar a dar mais valor àquilo que conseguia fazer antes.
E hoje, sempre que posso, agradeço a Deus tudo ter-me corrido bem, e aos poucos poder recomeçar a fazer a minha vida normal. Agradeço o andar, o sentir, o tocar, o cheirar, o olhar, o ouvir… Agradeço as minhas faculdades físicas e mentais, e agradeço, principalmente, por estar viva…
Desejo a todos aqueles que estão doentes, uma rápida recuperação, e que tenham neste Natal, o maior presente que se pode ter: muita saúde…

10 comentários:

(CARLOS - MENINO BEIJA - FLOR) disse...

Olha,eu fico muito feliz que tenha corrido tudo bem, apesar das dificulades e riscos. Deus a abençoe sempre. Beijos

Cristina disse...

Muito obrigada "menino beija-flor".
Espero que você também já esteja recuperado da má experiência pela qual passou.
Que Deus o acompanhe sempre e abençoe, também a si e todos os seus.
Beijos.

Anónimo disse...

Bem Miga,vim agora ao teu blog,e deparei-me com esta descrição!!!
Estavas mesmo apavorada não?? olha desculpa-me a conhecer-te como te conheço,até me ri com um sorriso maroto!!! tão avessa que tu és a medicamentos e todas estas coisas,imagino mesmo o que te passou pela cabeça.
Mas agora está tudo bem,e livraste-te de algo mau que tantos anos te fez sobrer.
Um beijinho e as melhoras
Ana

João Celorico disse...

Ora viva, amiga!

Há quanto tempo a não via. Agora, está tudo explicado!
A propósito, os médicos podem ser anjos bons e oxalá sejam sempre mas, já o dizia Fernando Namora quando escreveu “Anjos e Demónios da medicina”, infelizmente nem sempre as coisas correm tão bem.
Espero que já esteja tudo bem consigo e que não tenha os maus pensamentos que estava a ter e que só se compreendem pelo que estava a passar. Então já está a pensar em deixar de ser portuguesa? Deixe lá isso!

Por isso, levou-me a pensar
que não estaria boa de certeza
quando andou pr’aí a afirmar
a vergonha de ser portuguesa!

Pareceu-me tal afirmação
ser só um mero aparato
pois que a invocada razão
era a cimeira da NATO!

Será que, a ser verdade,
queria tocar castanhola?
Gabo-lhe eu tal vontade,
de se tornar espanhola!

Pois dizem todos bascos e catalães
galegos e outros, a quem isso custe,
os castelhanos são mais que as mães
e são quem em Espanha faz o ajuste!

E os franceses ainda este ano?
Estrangeiro, nem água bebe!
Não é só o romeno cigano,
é também todo o Magrebe!

Mas, temos o Reino Unido
onde a Irlanda é muito gira.
Até é tudo muito divertido.
E será que lá, manda o IRA?

Na Itália, pátria do belcanto
eles desafinam, por vezes,
pois gostam tanto, tanto
de correr com os albaneses!

E no Brasil de encantos mil,
que tantos encantos encerra,
e onde eles esticam o pernil
a muitos coitados “sem terra”!

Por tudo isto, minha amiga,
por esta pequena amostra
deixe que aqui eu lhe diga
que amemos a “Terra Nostra”!


Eu, não me canso de ser português, nem disso tenho vergonha.
A minha vergonha é de alguns portugueses e que parece cada vez serem mais!

Abraço e tudo de bom,

João Celorico

Cristina disse...

Querida amiga Ana,
Sim estava mesmo apavorada. Ainda estava na maca e já estava a pensar como tive eu coragem para me meter naquela situação. Mas já tinha chegado até ali, não podia arrepender-me.
E quando a Ana, estava eu ainda em pleno sofrimento, me dizia: “vais ver que daqui a uns tempos vais dizer que foi o melhor que fizeste…” Sim, tinha toda a razão. Foi o melhor que fiz. Aliás já devia era ter feito há uns anos atrás, em vez de deixar andar, a ver se melhorava…
Quanto aos medicamentos, sim, tem razão. Esta foi a única vez que pedi aos médicos para me darem mais compridos para as dores. Desta vez, era eu que queria mesmo tomar. Excepto aqueles que a Ana sabe, aqueles em que me queriam viciar, lol…
Lembra-se que eu até lhe disse: “Ana, eles querem que eu saia daqui viciada…” Quer dizer, ia ali buscar a cura para uma coisa, e saía dali viciada noutra, lol…
Obrigada por tudo, minha amiga… Pelas palavras, naqueles dias dolorosos, pela força e coragem.
Beijinhos,

Cristina disse...

Bem-vindo, amigo João,
Sim, já estou melhor, obrigada; o pior já lá vai.
E é verdade, eu que sempre me orgulhei de ser portuguesa, às vezes tenho vergonha de o ser. Fomos uma nação gloriosa no passado, conquistámos grandes feitos, e tanto que nós tivemos e acabámos por dar…
Olhar para o estado do nosso país, hoje em dia, causa-me uma imensa tristeza, e preocupa-me o futuro que terá meu filho, e todas as outras crianças…
De facto, o amigo tem razão, não consigo deixar de sentir orgulho em ser portuguesa, mas vergonha pelo que fazem certos políticos…Por isso nunca gostei de política. Para mim são todos iguais, só se interessam pelos benefícios pessoais que o cargo lhes poderá trazer. No dia que houver alguém mesmo interessado em salvar e mudar Portugal, então talvez isto mude para melhor…
Cada vez que o amigo aparece, ilumina-me a “casa” com seus bonitos e sábios versos. Muito obrigada por eles, adorei. Desta vez, esmerou-se ainda mais. Está de parabéns.
Quanto ao que diz sobre a vontade de virar espanhola, bem… eu já sou metade. Metade portuguesa, metade espanhola. Metade de Salvaterra do Extremo, metade de Zarza la Mayor. Família materna portuguesa, família paterna espanhola… o resultado foi esta “miscelânia” que tinha de ser “eu”, e que tinha de vir nascer a Lisboa…
Um abraço e tudo de bom também para si,
Cristina.

Anónimo disse...

Que belos versos Cris???
Tu mereces
E como o João Celorico diz não te canses de ser portuguesa,Eu,Nós temos é muito orgulho em sê-lo.
Alguns estragam...
Beijinhos
Ana

João Celorico disse...

Olá, Cristina!
Passei por aqui, só para lhe deixar as minhas Boas Festas.


NATAL

Do céu cai uma estrela
brilhante, prenhe de luz,
e todo o Mundo, ao vê-la,
vê nela o Menino Jesus!

E, quando na terra caiu
a estrela, enviada do Senhor,
o Mundo, todo ele, viu
o Menino, Paz e Amor!

Algo o Senhor terá esquecido
de fazer cair, cá na terra.
O Mundo parece perdido!
Em vez de Paz, só quer guerra!

Esqueçamos então todo o Mal,
em tempo de Boa Vontade!
Votos de um Santo Natal
e o meu abraço de Amizade!

De nós não se esqueça o Senhor,
pois muitos nos levam ao engano.
Além de muita Paz, muito Amor
e um muito Feliz Bom Ano!

João Celorico

Cristina disse...

Caro amigo João, que como sempre me deixa versos lindíssimos, bem que o Mundo precisava de uma nova luz, que apagasse tanto ódio, maldade, guerra e desumanidade. Uma nova luz que nos fizesse novamente acreditar que é possível viver em Paz. Uma nova luz que desse abrigo aos sem-abrigo, alimento a quem passa fome, agasalho a quem passa frio, trabalho a quem dele precisa, um rumo a quem anda perdido, e companhia a quem vive na solidão…
Uma nova luz que fizesse os homens respeitarem-se uns aos outros, e principalmente as crianças e os velhinhos…
Uma nova luz que permitisse viver o Natal todos os dias, pois é a época mais bonita do ano. Talvez assim, as pessoas fossem 365 dias: amáveis, simpáticas e solidárias. Talvez assim não se lembrassem só nesta altura dos mais carenciados, a todos os níveis…
Uma nova luz que apagasse o consumismo desta altura, e nos fizesse lembrar, que não é o Pai Natal a figura mais importante, mas sim o menino Jesus. É por ele que existe o Natal…
A si, não lhe desejo doces, pois fazem mal ao colesterol, não lhe desejo prendas, simples bens materiais… Desejo-lhe sim: muita união familiar, muita paz, muito amor, carinho, alegria, sonhos realizados, e principalmente muitaaaaaaa saúde, para que o Natal se possa repetir por longos anos da sua vida, na companhia de seus entes queridos.
Ou seja: desejo-lhe tudo aquilo que o dinheiro não pode comprar, pois isso é o melhor que temos na vida…
Seja muito feliz na noite de Natal, e em todas as restantes do ano.
Agradeço e retribuo o abraço de amizade.
Até sempre!
Cristina R.

Eugenia Santa Cruz disse...

Olá Cristina!
Passei agora pelo seu blog e deparei-me com esta notícia, como eu a compreendo! Pois estava eu muito bem aquando no dia de natal comecei com uma grande dor na perna direita, fui a 7 médicos, 3 vezes às urgências fiquei sem andar. Não tive tanta sorte como a Cristina, pois fiquei numa lista de espera para ser operada a uma hérnia estrangulada que me estava a matar com dores. Após ter levado 70 injecções e tomados vários comprimidos tive de procurar um Neurocirurgião particular e lá fui eu ser operada dia 20 de Janeiro a esta malvada hérnia na coluna. Apesar de já ser a 10 operação acredite que a sensação de entrar no bloco operatório foi a mesma, rezei, chorei estava apavorada. Mas Deus como sempre esteve a meu lado e guiaram as mãos daqueles anjos vestidos de branco, que nos fazem rir e nos põe a dormir, quando acordamos já tudo passou.
Um beijo e continuação de boas melhoras
Eugénia Santa Cruz