quinta-feira, 21 de agosto de 2008

O rio Erges em imagens...


O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai,
E de onde ele vem.
E por isso, porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia…

Excerto de “O Tejo é mais belo” (do “Guardador de Rebanhos” – Alberto Caeiro)

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

O céu estrelado de Salvaterra...

Numa noite quente e céu límpido de Agosto, olhamos para o céu e deslumbramo-nos com o mais belo espectáculo que a natureza nos pode oferecer.
Não há palavras suficientes que descrevam tamanha beleza.
E como me sinto pequenina no Universo a olhar para toda aquela imensidão celeste.
Sou capaz de ficar horas, assim. Lembro-me de quando meus avós eram vivos, e no tempo em que a electricidade ainda não tinha chegado a esta aldeia, sentávamo-nos à noite, na pedra que está à porta, a sentir o fresco da noite. E enquanto todos conversavam, eu ficava a olhar para o céu, até me doer o pescoço. Olhava e imaginava como seria bom poder ir lá acima, e a imaginação voava para todas as maravilhas que ali poderia encontrar. Acho que veio destas noites, o sonho desde menina, de ser astronauta. Hoje sorrio ao pensar neste sonho, mas quando se é criança, até se acredita. Porque não acreditar? Esta é a magia de ser criança…
Pois é, desde cedo comecei a viver no mundo da “Lua”. E hoje, já mulher, não resisto cada vez que cá venho, a voltar a olhar para o céu em certas noites de Agosto. Parece até que este é o melhor mês para observar os astros, e aqui, então, é extraordinário.
É uma sensação maravilhosa e grandiosa olhar para toda aquela imensidão do Cosmos e faz-me sentir tão pequenina. Como é pequeno e frágil o nosso mundo. Somos apenas uma gota na imensidão do Universo.
Quando olho o firmamento, minha alma enche-se sempre de inquietação. É o encantamento que só os poetas têm o dom de captar e transformar em palavras. É a grandiosa expressão da mais perfeita obra do Criador.
Quando ao sabor da suave brisa celeste, elevo meus olhos para o céu, parece que todos os problemas ficam para trás; parece que nada de mau me aconteceu na vida, e a minha mente enche-se de pensamentos de optimismo e coragem em relação à vida.
Quando o leve aroma da noite toma conta do ar que respiro, inspiro e encho meu ser de uma enorme sensação de paz e tranquilidade, deixando-me em harmonia com tudo o que me rodeia e com todos.
Ao fundo, oiço uma linda sinfonia, num ritmo orquestrado pelas criaturas da noite, pelos ventos uivantes que me vêm beijar a face, e deixo-me transportar pela imaginação. De repente sou criança outra vez. De repente, vejo-me de novo sentada naquele mesmo banco, e com meus avós ao lado. Ainda me lembro de algumas de nossas conversas que tivemos ali, em que meus avós me diziam incrédulos: “Oh filha! Mas tu acreditas mesmo que o homem foi à Lua? Acreditas que ele conseguiu construir aquele foguetão, e que conseguiu lá chegar? Filha, tu não acredites em tudo o que vês na televisão…” E eu sorria, e por mais que tentasse convencê-los que sim, que era verdade, nada os demovia na sua opinião. Acho que só passados muitos anos, e devido ao avanço da tecnologia, é que eles começaram a acreditar em certas coisas, não sei…
Quando surgiu a Rádio Monsanto, lembro-me de muitos serões passados à porta de casa, a sintonizar a rádio. Quando os filhos lhes ofereceram o rádio disseram: “ai, mas para que é que trouxeram cá isso? Precisamos agora nós cá disso…” Mas depois, nunca mais largaram o rádio, e já não passavam sem ele. Ali, ainda não tinha chegado a TV, daí este ser o único meio de que dispunham, para saber novas do Mundo e do país. E quando chegava a hora dos discos pedidos, estavam sempre sintonizados e fazia-se silêncio quando cantava este ou aquele cantor. Lembro-me de uma música em especial que meu avô adorava: “eu tinha um cavalo russo”. Como ele viva esta música… Acho que até sabia a letra de cor.
Belos tempos que não voltam mais…
E é assim quando nesta aldeia olho o céu: parece que todas as lembranças de uma vida me vêm à mente. Umas relembro-as com carinho e saudade, outras relembro-as como lições que a vida me deu e todos os caminhos que poderia ter seguido e não segui…
Com o passar da noite, quanto mais olho aquela imensidão, mais sinto que tudo o que é mau se esvazia de minha alma, e tudo o que é bom começa a correr por minhas veias. É a purificação natural da alma.
Aos poucos, fundo-me com a serenidade que me envolve, e como que renasço outra vez, encontrando motivos para continuar a viver cada vez mais e intensamente, tentando melhorar a cada dia e evitar cometer novamente os erros do passado.
Aqui, parece que inspiro no ar da noite uma coragem renovada.
De novo elevo meus olhos e deslumbro-me com a manta escura no céu estendida, repleta de estrelas luzentes e astros perdidos que vagueiam eternos.
Aqui, numa só noite, vejo imensas estrelas-cadentes. Aproveito e peço a cada uma um desejo, geralmente, sempre o mesmo (não é preciso muito para eu ser feliz).
Mas depois, lembro-me das aulas de Ciências: estrelas-cadentes são apenas meteoros que vagueiam pelo espaço, e que ficam incandescentes ao passar pela nossa atmosfera, ou seja: o rastro luminoso, dura apenas uns segundos, talvez por isso elas não tenham tempo sequer de realizar nossos desejos…
Sou assim eu, quando olho para o céu: penso em tudo e mais alguma coisa… Em milésimos de segundos, nem sei quantos pensamentos me ocorrem… Meu pensamento chega a ser mais rápido que uma estrela-cadente, lol.
Mas tantos como eu já olharam o céu. Por cima de nós encontra-se toda a sabedoria do Universo. Em tempos antigos, era no céu que os sacerdotes buscavam respostas para as suas indagações, que o marinheiro encontrava o rumo certo no mar, e que o lavrador descobria a época adequada para lançar a semente à terra. Tudo estava escrito nos astros, até mesmo a nossa vida…
Ao pensar nisto, procuro no céu uma resposta a minha perguntas, e o céu responde-me que só o tempo as dará…
Com o avançar da noite, e depois de muito tempo a vasculhar com o olhar, todos os recantos daquele pedacinho de céu, consigo vislumbrar a “estrada de Santiago”. Foi meu avô quem me ensinou como encontrá-la, bem como certos conjuntos de estrelas, como a Ursa-maior ou menor, as pleides, etc… E foi ele também que me contou a lenda associada à estrada de Santiago: “aquilo é um caminho no céu”, dizia ele. “Mas um caminho para onde?, perguntava eu. E ele respondia na sua imensa sabedoria: “é o caminho que fazem, em direcção ao céu, as almas penadas quando morrem. Todas as almas percorrem aquela estrada no céu…”
E eu deslumbrada, ouvia as suas histórias; histórias que passaram de geração em geração. Histórias que também um dia hei-de contar a meu filho…
Aqui há o mais lindo céu que possam imaginar. Uma beleza ímpar, que não há nas cidades ofuscadas por tantas luzes. E só aqui me sinto em paz com o Mundo e comigo mesma…
Este é um lugar especial, onde tudo parece ser possível; é um lugar que deixa muitas saudades a quem parte, e a esperança de sempre cá voltar…