O Verão está quase a terminar e a aldeia já chora os filhos que aos poucos vê partir, pela única estrada que lhe dá acesso. Estes levam na bagagem tantas recordações, momentos e emoções sempre aqui vividas. Levam lágrimas nos olhos, pois deixam para trás seus entes ou amigos queridos. É um pedaço deles que cá fica. Os seus olhos choram, o coração sente um aperto, na garganta um nó e a alma se entristece. Nunca se sabe se cá voltarão, pois a estrada da vida por vezes prega-nos partidas e termina a meio… Por isso se pede sempre, quando se parte, para cá voltar só mais um ano… E é vê-los partir, com os filhos ou netos no banco de trás, voltados para trás a acenar, a dizer adeus não só aos que ficam, mas também à aldeia que sabem ser deles, mesmo que não tenham cá nascido ou mesmo crescido. Será sempre deles, pois é aqui que estão e ficam suas raízes… E o conta-quilómetros vai passando, e eles vão-se afastando. E a saudade já começa a fazer-se sentir. Mas pensam que têm de voltar, pois a vida não é só feita de lazer ou férias. Para ganharem as férias neste local, têm de trabalhar noutro, longe, dentro ou fora do país… E lá se vão os emigrantes ou imigrantes, pela única estrada existente… Acenando às pessoas, às casas, ao campo, às árvores do caminho que parecem acompanhar-nos na corrida, durante grande parte do caminho, pelo menos, enquanto não chegamos à auto-estrada…

Quando viajo, tenho sempre a mesma sensação: à vinda parece que a viagem demora uma eternidade, à ida, chegamos tão rapidamente a casa, que até nos admiramos como pode ser o mesmo caminho. Deve ser porque à vinda, a ansiedade de cá chegar é sempre muita, daí parecer tão longo o caminho… E ao vê-los partir, esta pequenina aldeia fica ainda mais silenciosa do que já era. Só o sino da igreja corta o silêncio do ar com a badalada constante das horas. São tão poucos os que ficam, são tão poucos os que restam, os que sempre se recusaram a sair de sua terra. Mas ficam, e cá continuam o seu dia-a-dia, a maior parte com suas reformas míseras, dadas pelo nosso Estado, mas ficam, e cá vão sobrevivendo para sempre contar histórias de antigamente. Ficam, e ajudam-se mutuamente; são amigos solidários uns com os outros, são como que uma família, e sabem os problemas uns dos outros, as dificuldades por que passam, sabe-se tudo nesta terra. Sabe-se que o filho ou filha de fulano tal se divorciou, e ficou ou não com os filhos e como está a viver, sabe-se que fulano traiu fulana ou vice-versa, sabe-se das doenças que vão aparecendo… Sabe-se que fulano se doutorou em tal especialidade… Sabe-se do filho que nasce; sabe-se do filho que morre… Sabe-se de tudo aqui, mesmo que as coisas aconteçam longe… Aqui as notícias viajam à velocidade da luz e espalham-se que nem a chuva quando cai e se espalha pelos campos. Mas também se assim não fosse, de que falariam os poucos habitantes desta terra? Mas agora fala-se apenas dos filhos que partem e já deixam saudades. Fala-se da vida que levam por “lá”, e de seus empregos… Fala-se de tudo aquilo que sabem ou não sabem deles… É a saudade já a instalar-se. É o telemóvel que toca a dizer-lhes que chegaram bem e eles podem ficar descansados e reiniciar o seu dia-a-dia. Voltar para suas casas, agora tão vazias. E como ficam vazias as casas de quem parte… Como ficam vazias e silenciosas as ruas por onde andaram… Voltamos agora a prestar atenção ao som dos pássaros sempre alegres em final de tarde. E quando se ouve o barulho de um carro pensa-se logo: quem será que lá vem? Quando todos os outros partem… É o Verão que se despede, é a nostalgia do Outono que vai chegando. Antigamente com o Outono recomeçavam aqui as aulas, agora, já há muito a escola fechou, por falta de crianças… E é assim a minha aldeia. Sim, esta também é a minha aldeia, mesmo que não tenha cá nascido ou crescido… É e sempre será a minha aldeia, pois é aqui que estão minhas raízes…